06/09/2009

Dia a dia

Li recentemente Encontro em Samarra, de John O'Hara. O enredo se desenvolve no periodo entre o Natal e o Ano Novo, durante a Grande Depressão e no vigor da Lei Seca. É um romance seco, ironico e , de certa forma, perturbador. Lança um olhar agudamente crítico sobre a sociedade conservadora de uma pequena cidade americana. A edição que li tem um prefácio bastante esclarecedor de John Updike, introduzindo-nos na atmosfera do livro e também traçando alguns contornos sobre a vida conturbada de John O'Hara, um prolixo jornalista e escritor envolvido com alcoolismo.

Um pouco antes, tivera meu primeiro contato com o polêmico autor frances Michel Houellebecq, cujo livro Extensão do Dominio da Luta foi para mim um prenuncio de que o autor merece, no minimo, uma atenção maior. Já estão na fila outros tres romances do mesmo autor para serem lidos em breve

Em seguida, por uma grande coincidencia, encadeei a leitura de dois autores muito diferentes, mas cujos livros escolhidos tratam de enredos surpreendentemente parecidos, tanto na forma como no conteúdo. Falo de A Tregua do uruguaio Mario Benedetti e O Mar, do irlandes John Banville. Ambos têm como personagens centrais homens de meia idade, viuvos e solitários. Os dois personagens têm relações conflituosas com os filhos, recordações vagas e doloridas de suas antigas companheiras. Os dois autores escolheram a narração na primeira pessoa, permitindo um elevado grau de introspecção nas digressões dos personagens. Embora adotando estilos literários bem diferentes, o resultado de ambos é um profundo mergulho na alma humana, São livros inquietantes. Acredito que serão melhor compreendidos por aqueles que já atingiram a maturidade e, com certeza, vão encontrar ecos das reflexões dos personagens em suas próprias vivencias. Benedetti tem um estilo mais sério, menos lírico. Propositadamente adotou a forma de um diário e, sendo seu personagem um burocrático contabilista, não poderia lhe emprestar um estilo literário mais rebuscado. Assim, a narrativa transcorre naturalmente e nos transmite um ar de singelo realismo.

Dono de um estilo mais sofisticado, Banville escolheu para seu personagem central uma atividade ligada à história da Arte e, assim, também justifica a adoção de uma narrativa bem mais complexa, cronologicamente difusa e multifacetada. Enfim, trata-se de obras ímpares e que, por caminhos diferentes, nos levam a refletir e assumir conclusões muito próximas.
(Sobre O Mar, sugiro a resenha e análise do Rascunho)

Conforme já previra, voltei ao frances Michel Houellebecq. Seguindo a ordem cronológica de seus romances, li Particulas Elementares, sua segunda obra editada por aqui. Confirma-se o seu estilo mordaz e uma avassaladora critica à sociedade ocidental da geração 68. Os personagens são alter egos do autor, têm personalidades torturadas e buscam, cada um a seu modo, as explicações sobre o sentido de suas vidas. O estilo de Houllebecq é fluente, caleidoscópico, embora às vezes faça algumas concessões desnecessárias se aproximando do grand guignol e abusando de descrições um tanto literais.Trata-se de uma leitura pertubadora que pode provocar polêmicas, mas não a indiferença.

Uma boa avaliação do livro pode ser encontrada num texto de Cristovão Tezza que, por ser também escritor, consegue fazer uma leitura peculiar